terça-feira, 9 de janeiro de 2024

HAPPY BIRTHDAY, MR. PAGE!

 

E hoje, 9 de janeiro de 2024, o ilustre senhor James Patrick Page, a.k.a Jimmy Page, para toda a humanidade, um dos mais ilustres e celebrados músicos de todos os tempos, completa seus 80 anos de idade.

O renomado criador/idealizador/líder e guitarrista do Led Zeppelin, mítica banda que fez a cabeça de toda uma geração (e ainda faz, de muitos), começou, conforme muitos sabem, como um aplicado e consistente músico de estúdio. Existe uma lenda que corre o mundo do rock, de que pelo menos 80% de todos os discos e compactos de sucesso gravados por artistas pop ingleses, no período entre 1963 e 1967, tiveram a guitarra de Page figurando, inovando e preenchendo espaços, em diversas músicas. Muitas vezes, apenas pelo cachê que ganhava ou prazer de tocar, sem nem ser creditado nos encartes.

Os Yardbirds, com Jeff Beck e Jimmy Page (os dois, ao alto)

Em meados de 1966/67, ele é chamado pelo seu grande amigo, o também revolucionário guitarrista Jeff Beck, para ajudar a segurar as pontas no grupo do qual ele estava fazendo parte, os Yardbirds. Na verdade, o irregular e sempre insatisfeito Beck já estava intimamente programando a sua saída, e logo ele deixaria o grupo com Page ocupando integralmente a sua vaga. A partir daí, o resto é história, muitas vezes já contada e recontada: os Yardbirds estão em declínio artístico, a maioria dos seus membros abandona o barco, e sobra Jimmy Page segurando o nome da banda, com datas ainda contratadas de shows a fazer por toda a Europa. 

Isso é 1968. Ele não pensa duas vezes: é a grande chance de começar a ter e comandar um negócio próprio, um projeto musical com a cara, criatividade e identidade que ele gostaria que tivesse. E então, com a ajuda do amigo e empresário Peter Grant, ele recruta alguns caras talentosos, e o Yardbirds passa a se apresentar como New Yardbirds, e dali a mais alguns meses, já como... Led Zeppelin!

Led Zeppelin

Ah, e por favor, nunca se refira ao Zeppelin como inventor do heavy metal perto de Mr. Page. Esse é um título que ele simplesmente ignora, para não dizer que detesta. Eddie Trunk, o apresentador do popular programa de TV That Metal Show, já disse certa vez: "Page já disse que até gostaria de vir ao meu programa, nós o convidamos várias vezes. Mas ele foi bem enfático de que a mais reles menção ao termo 'metal' o afasta, ele não gosta de se ver com qualquer relação a isso". 

Assim sendo, chame o som do Zeppelin e da guitarra de Page de qualquer coisa, menos de heavy metal. Ele prefere termos como blues pesado, folk com influências de world music, ou simplesmente, rock (o bom e velho "Rock and Roll" - vide a icônica faixa do Led Zeppelin IV,, de 1971). Ele também é muito venerado e reconhecido por seu estilo bem peculiar e não ortodoxo de solar - algumas vezes, pela saraivada de notas e acordes inesperados que ele atinge em suas canções, ele já teve seu estilo chamado de guitarra "histriônica" ou "notas com efeito pipoca" (risos). Seja como for, esse é o marcante estilo Page.


E do mesmo modo que um monte de sites fazem por aí, vamos comemorar essa data e a nossa admiração pelo cara com aqueles que são, na nossa opinião, "20 grandes e memoráveis momentos de Page" - seja antes do Led Zeppelin, durante, e depois do fim da banda. Dá pra fazer uma playlist legal para saborear as guitarradas estupefacientes de Mr. Page. Você concorda? Ou haveria outros? Confere aí, e vamos lá.


Pré Led Zeppelin:

1 - Stroll On (c/ os Yardbirds, 1966) - a icônica versão feita para um dos primeiros hits dos Yardbirds, a tradicional "Train Kept-a Rolling", só que com uma seção rítmica mais acelerada, mais pesada, e um sensacional duelo de guitarras entre os então integrantes Jeff Beck e Jimmy Page. Imortalizou a imagem do grupo nos cinemas, pois foi gravada para uma aparição especial deles no clássico filme de Michelangelo Antonioni, Blow Up, de 1966 (no Brasil, 'Depois Daquele Beijo'). Detalhe: conforme pode ser visto na cena, Page está segurando um baixo (e pelo visto, rindo muito disso e do quebra-quebra encenado pelos colegas de banda), visto que na época essa seria a função inicial dele ao entrar, deixando as guitarras só para Beck. Mas logo ele reassumiria o seu instrumento de lei, e na gravação são ele e Beck que tocam guitarra.


2 - Think About It (c/ os Yardbirds,1967) - na opinião de muitos, o grande clássico dos Yardbirds com Jimmy Page, lançada em single para a promoção do último álbum da banda, Little Games. Já contém a rifferama com tons soturnos, e os solos sinuosos e faiscantes, que fariam o fama de Page no som do Led Zeppelin.

3 - Puzzles (c/ os Yardbirds,1967) - esta simples e esquecida canção escondida no álbum Little Games contém o solo tocado por Page na futura "Dazed and Confused", do Led Zeppelin, ainda em estágio embrionário, e é outro exemplo de como Page já vinha trabalhando a sonoridade dos Yardbirds para que ficasse mais intensa, rumo ao peso do Zeppelin.

4 - White Summer (c/ os Yardbirds,1967) - o outro lado de Page, sua paixão por sons folk acústicos, e de nuanças indianas e orientais, aparece pela primeira vez aqui, nesse instrumental dos Yardbirds que seria retrabalhado adiante no primeiro álbum do Led Zeppelin, e se tornaria "Black Mountain Side". Foi o ponto de partida para uma série de sons mais sutis e suaves que Page trabalharia com esmero em sua carreira, sempre casando o lírico com o pesado.

5 - Hurdy Gurdy Man (c/ Donovan, 1967) - uma das várias (e mais famosas) colaborações de Page como session man, foi a música título de um sensacional disco lançado pelo bardo escocês Donovan, de muito sucesso na Inglaterra riponga da época. Aqui, ele introduz um solo batstante hipnótico, com fuzz estridente e super heavy que foi um dos maiores destaques daquele ano, mostrando que estávamos diante de um guitarrista incomum.

6 - With a Little Help From My Friends (c/ Joe Cocker, 1968) - para quem assistiu a inesquecível performance do cantor soul inglês Joe Cocker no Festival de Woodstock (1969), apoiado pela Grease Band, pode ser uma grande surpresa saber que aquele riff pauleira introdutório de sua versão para "With a Little Help...", na guitarra, é uma criação e gravação original de Jimmy Page, acompanhado por outros músicos contratados, na versão de estúdio. Entrou para a história.



No Led Zeppelin:

7 - Communication Breakdown (1969) - e chega o Led Zep em sua estreia fonográfica, de cara metendo o pé na porta com essa porrada mastodôntica que é "Communication". Sorry, Mr. Page... mas as palhetadas maníacas impressas nesta obra-prima a tornam precursora sim do heavy metal, e muito - tanto é que o Black Sabbath já confessou que a música "Paranoid" foi a sua tentativa frustrada de fazer algo no estilo de "Communication Breakdown". Solo cristalino e viajante de Page, o baixo forte e preciso de John Paul Jones, a locomotiva sonora desenfreada de John Bonham na batera, e os uivos rasgados e desesperados de Robert Plant. Pronto, a bagunça estava feita. Agora, não tinha mais como voltar atrás, e o Zeppelin estava pronto para subir... beeem alto.

8 - Dazed and Confused (1969) - num dos mais polêmicos, e diversos, casos de plágio da carreira do Led Zeppelin, essa era uma canção derivada de um blues do cantor britânico Jake Holmes, mas que foi convertida em uma sorumbática marcha hard rock, pontuada pelo baixo sinistro de J. Paul Jones e a guitarra etérea de Page. Dá início às grandes experimentações sonoras do grupo em estúdio, e ao vivo - com as performances progressivas de Page usando um arco de violino nas cordas da guitarra de forma cada vez mais assombrosa, e com durações cada vez mais estendidas. Algumas rendições da canção chegavam a quase 40 minutos de duração, no palco, repletas de longos solos e improvisações. Clássico absoluto.


9 - Whole Lotta Love (1969) - talvez o mais "comercial" e radiofônico sucesso do Led Zeppelin, este grande clássico do segundo LP da banda foi um dos poucos a ser promovido como compacto, já que a ênfase deles seria sempre nos álbuns, como um todo. É um blues casado com um semi-funk extremamente suingado, calcado no riff histórico da guitarra de Page, e com uma desafiadora passagem psicodélica e erótica providenciada pelos vocais enlouquecidos de Robert Plant, cedendo lugar a um dos solos mais devastadores de Page logo em seguida. Também bastante "experimentalizada" nos shows ao vivo, formando grandes medleys com outras músicas.

10 - Heartbreaker (1969) - poderíamos dizer que é, simplesmente, um dos melhores showcases de Page, simplesmente isso. Mega blues pesado, com o cara abrindo a lojinha de solos bem no meio da música, de portas escancaradas.

11 - Since I've Been Loving You (1970) - está na galeria dos grandes blues melancólicos dos anos 70. Essa pérola do terceiro disco do Led Zeppelin vinha para mostrar que eles sabiam sim, fazer música sensível e pungente no estilo de um B.B. King ou Buddy Guy, mas num crescendo bastante interessante, que dava mostras do poder da banda para trabalhar com baladas que poderiam conter atmosferas de diversos tons. Havia o peso, mas havia também a grande musicalidade do Delta/Mississipi em tudo.

12 - Stairway to Heaven (1971) - não tem como criar uma lista dessas aqui sem falar nela, o maior dos hinos, a pedra filosofal do Zeppelin. Mas apesar da superexposição midiática excessiva, que passou a despertar até mesmo a ojeriza dos membros da banda em torno dessa música, de tanto que ela era demandada por fãs e admiradores, feche seus olhos e tente apenas por um instante pensar nela como algo oposto - não como o grande sucesso que se tornou, não como uma das mais populares canções de rock de todos os tempos, mas simplesmente, pelas suas intrínsecas qualidades e características. Vamos fazer de conta que ela nem fez sucesso, que ficou esquecida lá em algum disco do passado. E então, mergulhe novamente nos dedilhados delicados e quase pastorais de Page, na instrumentação barroca de Paul Jones e nos vocais medievais de Plant, tudo isso evoluindo para um andamento folk bem concatenado onde a percussão de Bonham entra elegante e poderosa, e de repente, tudo isso já mudando para um hard rock épico, ornamental e quase sinfônico, com um dos mais inebriantes solos de guitarra já criados. Parabéns: você está ouvindo mais uma vez "Stairway", sob a luz de uma nova vivência!


13 - The Rain Song (1973) - quando eu falei lá atrás que as experiências acústicas de Page não eram brincadeira e iriam evoluir pra coisa muito da boa, é porque chegamos até aqui, nessa obra-prima do Zeppelin que é "Rain Song". Uma canção com camadas de violões e guitarras tão bem feita, que mesmo quem torcia o nariz para esse lado mais "soft folk" do grupo acabava se rendendo à beleza dela. E para quem acha que Page era fominha de solo e apenas ele queria aparecer, eis aqui a prova contra: toda a sutileza dos diversos takes de violão e guitarra gravados por ele servem de cama para o baixista/tecladista John Paul Jones protagonizar um belíssimo solo de mellotron.

14 - The Song Remains the Same (1973) - havia dúvidas de que era possível fazer uma pancada hard rock bem poderosa, com guitarras no estilo folk e semi-acústico que Page também adorava? Bem, aqui ele encarou o desafio. E foi bem sucedido. Um dos maiores clássicos do grupo, dá nome ao cultuado filme que lançariam alguns anos depois, retratando o show deles no Madison Square Garden em 1973.

15 - Ten Years Gone (1975) - mais uma das belíssimas baladas do grupo, contida no álbum duplo Physical Graffiti. Chama a atenção novamente pelas diversas camadas de guitarras, com diferentes tons e efeitos, gravadas por Page para realçar o clima da canção.

16 - Achilles Last Stand (1976) - este épico viajante de 10 minutos contém, não só na minha opinião, mas do próprio Jimmy Page, aquele que é considerado um dos melhores solos já gravados por ele em todos os tempos. É melancólico, é denso, é grandioso, e simplesmente atemporal - é tudo isso simultaneamente. Mas não é apenas isso: com um andamento galopante e arrebatador, não muito comum para o Led Zep na época, "Achilles" também revela a genialidade de Page como compositor, arranjador e produtor da banda, pois captar o trabalho estonteante que esse cara teve, balanceando todos os elementos de vocal, baixo, bateria, e as diversas camadas de guitarra rítmica e solo nessa música, de forma tão majestosa, é coisa pra realmente fritar o cérebro de qualquer um.

17 - Tea For One (1976) - assim como a música anterior, também está presente no álbum Presence, de 1976. É basicamente uma retomada do blues lento e reflexivo de "Since I've Been Loving You" (comentada aí anteriormente), só que de forma mais pesada, passional, e com um clima mais decadente. A carreira do Led Zeppelin, mal sabiam eles, estava chegando ao fim, aliás, com a prematura morte de John Bonham.

18 - In the Evening (1979) -  talvez um dos momentos mais realmente memoráveis de um álbum que divide opiniões até hoje, In Through the Outdoor, o último do Zeppelin. Com uma sonoridade mais kitsch e pop, pasteurizada por sons de teclados em excesso e composições menos inspiradas, foi um disco que deixou uma baita incógnita na cabeça de todo mundo sobre qual o som que o grupo iria produzir a partir dali - seriam um pastiche da onda new wave que estava tomando conta de tudo? Se tornariam algo no estilo "hard rock farofa" mais pop, de arena, que muitos grupos da época passariam a praticar? Ou voltariam ao peso e ficariam cada vez mais pesados ainda, aí sim, indo rumo ao estilo heavy metal, cujo rótulo eles mesmos tanto renegavam? Nunca saberemos. Apenas podemos curtir esse último grande momento épico de Page no grupo, direcionando uma música que funciona quase que como um arremedo de blues acelerado e apocalíptico de final de século, com uma guitarra super saturada mandando o riff infernal, e solos bem recheados de overdrive.


Pós Led Zeppelin:

19 - Live in Peace (c/ The Firm, 1985) - como muitos sabem, a carreira de Page depois do fim do Led Zeppelin foi mais calma e sem grandes arroubos, como na época do grupo de suas glórias - "gigantes que caminhavam sobre a Terra". Ele teve um disco solo, teve uma aventura com seu ex-parceiro de banda Robert Plant no projeto Honey Drippers, tocou empolgado em todas as esporádicas reuniões dos remanescentes do Zeppelin para concertos e shows ao vivo, ao longos dos anos, e ainda se reuniu com o vocalista David Coverdale (da antiga banda rival Deep Purple), para um disco em parceria em 1993, e novamente junto com o adorado colega Plant, no projeto Page & Plant, durante alguns discos e turnês nos anos 90 e início dos 2000. Mas foi no zeloso ofício de curador, produtor e remasterizador de toda a obra do Led Zep que Page realmente se debruçou, com seus diversos relançamentos e raridades póstumas, até hoje. Mas... um capítulo a parte, e muito legal, foi esse projeto com o ex-vocalista do Free e Bad Company, Paul Rodgers, no megagrupo The Firm, no início dos anos 80. E o grande hit foi essa "Live in Peace" - música inspiradíssima, de tons pacifistas, bonita balada levada ao piano que logo desagua num solo enlouquecido de Page, típico de seus melhores momentos no Zeppelin. 

20 - Shake My Tree (c/ David Coverdale, 1993) -  buscando reminiscências do blues rural e das camadas de guitarras entrelaçadas dos melhores momentos do Zeppelin, Page faz uma bela releitura do estilo delta entremeado com riffs de pedradas hard como "Travelling Riverside Blues" e "Nobody's Fault But Mine". Faz parte da parceria com David Coverdale que gerou um disco completo em 1993 - e olha, eu juro que em alguns momentos o vocalista parecia estar possuído pelo espírito de Robert Plant.



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