Nota: Este texto já estava sendo escrito quando, no dia 13 de novembro de 2024, Francisco Wanderley Luiz, 59 anos - popularmente conhecido como "Tiu França", em Rio do Sul (SC), onde concorreu para vereador, nas eleições municipais de 2020, mas perdeu - paramentado como o personagem Coringa, e carregando diversos artefatos consigo e em seu carro, detonou com a ajuda de timers todos os explosivos na Praça dos 3 Poderes, em frente ao STF, morrendo ele mesmo com graves ferimentos na cabeça e do lado direito do corpo, durante o ataque, já classificado como um ato de terrorismo. Francisco era de extrema direita, filiado ao PL de Santa Catarina, e as suas intenções de praticar alguma espécie de 'ato libertário' e radical já vinham sendo expressadas em suas redes sociais há um bom tempo. Mais uma vez, a realidade consegue chocar mais do que a ficção, e engendrou uma trágica coincidência com o texto desta postagem, visto que aparentemente se tratou de um ato isolado, e Francisco pode ser considerado agora mais uma vítima da terrível polarização política que o país vive, e que atinge mentes mais frágeis. Ao longo de nosso texto, as ideias aqui abordadas serão ilustradas com alguns dos prints de suas bizarras declarações.
E aí? Você é de direita ou de esquerda? Fale agora, ou cale-se para sempre.
Praticamente lhe asseguro de que é melhor se calar para sempre. Não fale, não se declare. Não ceda às paixões de uma luta ideológica que, a todo instante em que irrompe, já renasce velha, careta, e ultrapassada. Esquerda e direita, vermelho e azul, Krushchov e Nixon - essas dualidades não tem mais razão de ser. Acreditar que há uma distinção tão nítida e solidamente bilateral assim é querer ceder a uma ilusão que, ainda hoje, é financeira e sociologicamente muito bem utilizada pela classe política e seus partidos. Sim, exatamente isso que eu disse: financeiramente (uso do dinheiro alheio) e sociologicamente (manipulação, "entrar na mente", fazer a cabeça das pessoas).
Me arrisco a dizer que, caso não existissem as redes sociais de hoje, e a tecnologia não tivesse evoluído as mídias de comunicação e interação entre os humanos da forma que fez e vem fazendo - agora, um pouquinho mais amplificada e acentuada com a participação dos robozinhos IA - provavelmente, não teríamos o embate tão acirrado que ainda se vê entre as correntes ideológicas do capitalismo e do comunismo.
A recente vitória de Donald Trump para presidente, nas últimas eleições nos EUA, agitou as mídias sociais e veio a recender, ainda que em uma menor escala, algumas pequenas grandes discussões que já andavam um pouco apagadas aqui no Brasil, há uns tempos atrás. Agora, volta-se a falar no predomínio de uma ideologia aqui, em detrimento de uma ideologia acolá.
O mundo virtual empolga até os mais retraídos, estimula falas, opiniões e discussões (ainda que sejam as piores possíveis), e transforma em verdades as mais loucas crenças, teorias e percepções. Florescem os debates e se intensificam as animosidades. Vigiai: interesses, dos mais ocultos, geralmente estão na gênese de todas elas.
A tal rivalidade entre direita e esquerda se tornou a cartilha pela qual partidos políticos organizam as suas diretrizes para arrebanhar mais filiados e eleitores. Na maioria das vezes, não é preciso nem declarar tão diretamente a referida orientação: tendências e expressões como "progressismo" ou "liberalismo" já entregam a vinculação de políticos e legendas a uma determinada corrente.
Mas, ainda que estejamos imersos em tantos ideais nesse mundo das ilusões, atentem: nada disso é motivo para o fim de amizades antigas ou rupturas familiares; nada disso deve levar a violências, insultos ou agressões de qualquer natureza. O que vemos acontecer no cotidiano, infelizmente, vai na contramão disso. A polarização vem se tornando a arma utilizada por setores da classe política para manipular interesses, racionais ou não.
Pois tudo se trata, tão somente, de uma dualidade que se convencionou natural no mundo, desde a criação de linhas específicas do pensamento sócio-político e econômico, no desenvolvimento das nações, a partir de certo ponto da história da humanidade. Mas linhas que se embaralharam de uma tal forma, nos dias atuais, que muito ainda ocorrerá de subversão e alteração das ordens já estabelecidas.
Basta prestar atenção, que não existe mais direita sem uma certa contaminação da esquerda - assim como não existe mais esquerda sem contaminação da direita. Os extremistas do capitalismo e do livre mercado tomaram para si as falas iradas típicas das revoltas de classe e indignação com as autoridades, tão caras antes aos bolcheviques, cubanos de Guevara e outros que levantavam a bandeira vermelha do martelo e da foice, usam essa revolta e essa fala de indignação das massas para arrebatar votos, para conquistar pessoas humildes, para deliberar teorias do "Estado ladrão", da queda das taxas e impostos e do lucro da salvação, quando na maioria das vezes não conseguem desinchar o Estado tecnocrata que eles mesmos alimentaram com acordos escusos entre os poderes instituídos (sem falar no quarto poder, especialíssimo, que é a imprensa). Por outro lado, os esquerdistas que chegam ao poder se desvirtuam, se banham nas delícias da soberba, da ostentação e do consumismo, esquecem ou renegam seu passado e suas bases de luta, são como sindicalistas pelegos, estão às voltas com as nababescas reuniões e jantares nas távolas longas e suntuosas de empresários dos mais diversos ramos, empreiteiros e banqueiros. Envergam e se inclinam nos mesmos vícios daqueles antes tão criticados por eles.
E não estou falando que só no Brasil que é assim.
Pensar na perfeição utópica de um regime puro, seja ele de direita ou de esquerda, que funcione na prática, já era de uma ingenuidade estupenda há décadas atrás; hoje, é se inebriar de um engodo quase mortal.
Na democracia, a esquerda e a direita são as duas pernas que andam, e sustentam o corpo. Quando se desarmonizam de tal forma, que o desequilíbrio ameaça tudo, a queda ocorre, o corpo cai e padece. A realidade que a sociedade tem que passar a encarar é essa: cada corrente deve ter seu valor e autonomia, e uma depende da outra para ser o que é, se autenticar, bem como para manter um mínimo de coerência, observação, crítica e oposição nas coisas do Estado, sem radicalismos. Absolutismo corrói a ordem e as instituições. Uma perna que não anda no mesmo passo que a outra faz o corpo mancar, e tombar - isso causa dor e sofrimento, as consequências são inevitáveis.
Existem áreas nefastas e tenebrosas do poder público, onde ocorre justamente o citado anteriormente acerca da tal 'contaminação' das ideologias: são os intestinos da politicalha. Não da verdadeira política. Mas da politicalha - porca, suja e indecente, cheia de interesses corrosivos da coletividade, onde os conchavos mais sórdidos são fechados, e as fatias do bolo são repartidas com opulência e individualismo, sem nenhuma reserva moral.
Como uma forma de confirmar todas essas coisas, segue uma entrevista recente, em um canal de podcast, de alguém que é do próprio meio, mas que em nosso entendimento, já possui uma certa independência para realizar certas afirmações, bem como uma aparente repulsa de certas práticas presenciadas, em sua vivência como parlamentar - estamos falando de Alexandre Frota.
Ele declara que vai encerrar o seu mandato como deputado federal na Câmara em Brasília, pois foi eleito vereador de Cotia, no interior do Estado de São Paulo, nas últimas eleições municipais, e compareceu no podcast Chupim, da Rádio Metropolitana (SP), no dia 31/10/2024, para fazer um relato dessa experiência, e conversar um pouco sobre o panorama político da atualidade.
Veja o que ele fala, especialmente, entre os 25 e 38 minutos do vídeo, e que norteia muito do que está sendo comentado aqui:
Você pode não gostar do indivíduo, pode até achar que se trata de hipocrisia, e que ele não deveria falar assim de um meio no qual ele conviveu durante um bom tempo, aquela fauna toda de Brasília. Mas Frota passa uma impressão de estar sendo sincero, e descompromissado com todo o "castelo de cartas" pelo qual passou em seu último mandato. Ele tem uma visão ácida e aguçada no que relata sobre as reuniões de acordos de seus colegas do Distrito Federal, e que acreditamos ser uma realidade crua, vil, e lamentável. E que mostra que, para uma grande parte de nossos representantes eleitos, existe um elemento diante do qual, de fato, não sobrevive nenhuma ideologia, seja ela qual for: $$$.
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