quarta-feira, 24 de julho de 2024

SOB AS SOMBRAS ETERNAS DO NAZISMO

 

Muito já se falou e se produziu a respeito da Segunda Guerra Mundial e do pesadelo do Holocausto, em diversas e numerosas obras da História, da literatura ou das artes. O material de arquivo é extenso e abrangente, formando um rico painel de como aquele conflito lento, arrasador e compassado, dizimou uma grande parte da raça humana, nos idos de 1939 a 1945.

Mas é muito importante que todos aqueles que possam dispender um tempinho, e que tenham oportunidade, deem a si mesmos uma chance de conhecer um dos melhores e mais pungentes documentários já feitos, que retrata toda a linha de acontecimentos que culminaram naquela tragédia desoladora: o recente Hitler e o Nazismo - Começo, Meio e Fim (2024), dirigido por Joe Berlinger, e disponível na Netflix desde o início deste mês.

Essa muito bem cuidada produção em 6 episódios relata, em diversos pormenores, todo o trajeto pavimentado para que Adolf Hitler saísse de uma juventude miserável e sem perspectivas de sua terra natal, na Áustria, e gradualmente chegasse ao posto de líder político e militar (fuhrer) de toda a Alemanha, passando como um rolo compressor (ou tanque Panzer) por cima de tudo e de todos que estivessem em seu caminho.

Entre farto material com imagens de arquivo, e partes com encenações dramáticas perpetradas por atores com reconstituição de época (assim como em outras produções do gênero), a série da Netflix se esmera em rebuscar detalhes cruciais para o entendimento do conflito.

O que diferencia esta de outras séries documentais que abordam os mesmos fatos históricos é a capacidade de nos colocar absurdamente dentro da narrativa e de todo o clima da época. Isso se deve ao fato de todo o material utilizado se apoiar consistentemente nas experiências do jornalista americano William L. Shirer, que trabalhou como correspondente de guerra para a CBS e outros importantes veículos de imprensa dos EUA. Um dos mais importantes repórteres de seu tempo, e testemunha ocular da fulminante ascensão (e queda) de Hitler e do nazismo na Europa, Shirer tem aqui reproduzidos tanto os seus relatos em gravações históricas das transmissões de rádio sobre os acontecimentos, bem ali, no momento em que ocorriam, como em trechos de seus livros a respeito do holocausto, narrados por sua própria voz, recriada com inteligência artificial para a série.

Outra importantíssima perspectiva que o documentário nos apresenta: a reprodução quase integral de tudo o que ocorreu no célebre Julgamento de Nuremberg (1945-46), em que os criminosos de guerra nazistas foram julgados e condenados pelo primeiro grande tribunal internacional reunido para tal finalidade. São exibidas, pela primeira vez, filmagens originais de várias sessões do julgamento, com reprodução de áudios digitalmente restaurados dos depoimentos, e de argumentações da acusação e defesa - uma preciosidade à parte, para estudiosos e diletantes de História e Ciências Jurídicas.

Mas o que nos remete, imediatamente, ao mais profundo arrepio, misturado a sentimentos de repulsa e indignação, talvez seja o quinto episódio da série (Crimes contra a humanidade), que mostra com crueza extrema, e riqueza de detalhes, como se deu em larga escala o extermínio de milhares de judeus nos campos de concentração nazistas. São cenas feitas para chocar, e que precisam ter esse intuito mesmo.

O emblemático trilho da estrada de ferro, símbolo da fachada do lendário campo de concentração de Aushwitz, retratado na série

A humanidade não pode esquecer o que ocorreu ali. E o que levou para que aquilo acontecesse.

Existem centenas de células neonazistas no mundo atualmente. No Brasil, país de população secularmente miscigenada, supreendentemente a situação não é menos preocupante. Em 2021, foram recebidas e processadas pelo Conselho Nacional de Diretos Humanos nada menos que 14.476 denúncias anônimas de grupos neonazistas, armados ou não, mas disseminadores de manifestações de ódio e violência em redes e grupos sociais. Em dezembro de 2022, quatro pessoas foram mortas por um estudante de 16 anos, trajado de farda militar com as insígnias da suástica nazista, no município de Aracruz (ES).

Só no ano passado (2023), denúncias apontaram que existem 63 grupos devotos dessa ideologia em Blumenau (SC). Só na Grande São Paulo, foram descobertos e denunciados 96. 

Símbolos e adornos apreendidos após autuação de grupo neonazista, no Rio Grande do Sul

Apenas isso já nos dá uma ideia de como o perigo das sombras do nazismo é sempre constante, e paira sobre nós. Se grupos de pessoas comungam desses ideais, e se infiltram em núcleos políticos de poder, aí a coisa se agrava - só Deus sabe até onde a ameaça pode efetivamente sair do campo da teoria, e enfim atingir a prática. E a série da Netflix mostra bem isso: tudo ocorreu muito suavemente, de forma tranquila, como se para as populações do mundo fosse a coisa mais natural e legítima do mundo a ascensão de Hitler e suas ideologias ao poder. Tudo muito calmo e imperceptível. Até que o mal mostrasse seus dentes no momento certo.

William L. Shirer sabiamente avisava, a todos os seus amigos e familiares: "vigiem, sempre. Prestem atenção nos detalhes, não se distraiam". Tudo pode voltar a acontecer. De formas diferentes. Mas pode voltar a acontecer.

Aqui no blog, façamos nossa parte.

Seguem alguns canais de contato e suporte, para denúncias em relação a grupos ou pessoas incitadores de intolerância e ódio, caso alguém que nos lê fique sabendo de alguma coisa suspeita. Divulgue. E lembre-se sempre: você pode ajudar a evitar.

www.canaldeajuda.org.br - Canal on-line para denúncias contra grupos ou indivíduos nazistas, armados e/ou paramilitares.

https://new.safernet.org.br/denuncie - Canal on-line de denúncias da SaferNet Brasil, organização não governamental que atua como orientadora e vigia das boas práticas no uso da internet, com ênfase em denúncias com suspeitas sobre ofensas e ilícitos em fóruns e redes sociais.


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