sexta-feira, 31 de maio de 2024

COPPOLA: AS LOUCAS CAVALGADAS DE UM VISIONÁRIO

 

Apenas alguns dias se passaram desde a premiére do último filme de Francis Ford Coppola, o tão aguardado e anunciado épico Megalopolis, no prestigioso Festival de Cannes, em sua edição de 2024. E os críticos já se dividiram, enormemente: ame ou odeie, é 8 ou 80, "Coppola é um gênio", ou "Coppola pirou", tipo assim, como esse velhote se atreve a fazer uma piada dessas, parecendo um filme de amador mal dirigido e tão auto reverente, tão cheio de si, que atrevimento!

Reclamam de cenários bregas, de atuações caricatas e exageradas, reclamam de furos no roteiro e tudo o mais - sem se darem conta de que, talvez, tenha tudo isso sido intencional, numa das maiores críticas (sátiras?) do atual estado de coisas em que nosso mundo absurdo se encontra. Especialmente nas artes. 

Olha, pra começar, é o seguinte: só pela iniciativa dele, o cara já merece aplausos.

Alguém que arranca grana do próprio bolso, vendendo uma vinícola completa (fazenda, de "porteira fechada", como se diz aqui na minha terra), só pra financiar um filme... só pra creditar em "arte" - no mais sublime sentido do termo - merece um mínimo do nosso respeito e admiração. Em um panorama cada vez mais mercenário em que vivemos, hoje em dia. 

Coppola brigou para realizar clássicos viscerais como O Poderoso Chefão, A Conversação e Apocalipse Now. Filmes de uma envergadura criativa fora do comum, que não seguiam fórmulas prontas e não eram feitos para agradar executivos de estúdio ou plateias fáceis, e que emergiam de uma visão artística pessoal e injetora de novas ideias e possibilidades cinematográficas. Não haveria porque ser diferente com esse novo filme.  



'O Poderoso Chefão' (1972) e 'Apocalypse Now' (1979) - clássicos insuperáveis, à frente de seu tempo


Chega de frescura, geração mi mi mi. Se a Netflix, Amazon ou qualquer outro conglomerado de streaming tivessem topado a aventura de comprar os direitos de exibição de Megalopolis, e estivessem injetando dinheiro e propagandas nele (coisa que o próprio Coppola não quis, por seus princípios morais e pessoais - conforme vou explicar aqui, adiante), os baba ovos usuais da atual indústria midiática não estariam assim tão divididos. 

O filme é esteticamente arrojado e ambicioso. Conta a história de uma Nova Iorque futurista e apocalíptica, reconstruída nos moldes de Roma, sob o monopólio de um prefeito conservador (Giancarlo Esposito). O protagonista, um arquiteto excêntrico e visionário interpretado por Adam Driver, que tem acesso a um novo tipo de "energia" física e sobrenatural, quer tomar as rédeas do lugar e recriá-lo conforme seus sonhos artísticos, é um alter ego de Coppola - o louco e genial, aquele que se atreveu a, junto dos coleguinhas George Lucas, Scorcese, Spielberg e outros, reescrever a história de uma Hollywood também já decadente nos idos finais dos anos 60 e início dos 70, à beira da queda tal qual Roma. 

Aos nossos olhos, espectadores fãs desse incansável cineasta de 85 anos, que reúne suas últimas forças para nos deleitar com um delírio visual e sensorial, a energia a que Coppola tem acesso é seu próprio talento e bravura, para fazer frente a um mundo cada vez mais emburrecido e comercialóide. Onde ficou tudo meio parecido, padronizado, pasteurizado, e serviços de streaming se sentem no direito de aumentar valores e preços a seu bel prazer, enquanto empurram catálogos de qualidade cada vez mais duvidosa e lamentável para nossos lares.

Se Megalopolis permanecer fora dos circuitos mainstream da produção industrial em massa, de filminhos descartáveis feitos só para faturar em telonas e streamings da vida, que assim seja. 

Vamos procurar e assistir aonde for, para nos lembrar do ímpeto que a verdadeira arte ainda pode promover nos corações e mentes da humanidade. 


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