O mundo ainda respira os ares do Oscar vencedor de Oppenheimer, de Christopher Nolan, neste março de 2024, enquanto surgem as últimas discussões acerca do desastre total, completo e irrestrito que foi aquele filme da Madame Teia (2024), nossa senhora, o que é aquilo.
Quando a própria atriz principal da empreitada (Dakota Johnson, a protagonista), que é quem deveria estar desfrutando os louros do êxito, e com orgulho do que fez, se põe a ela mesma detratar o filme, e falar mal do que o estúdio e produção fizeram, alterando o script original e transformando tudo numa salada de equívocos, é porque parece que realmente chegamos no fundo do poço desse enorme hype que surgiu chamado "filmes de super herói".
Veja bem, o projeto é da Sony, e não da Marvel, que é o estúdio símbolo de toda essa geração de seres fantásticos que tomaram as telonas - apesar de usar personagens da Marvel, por ser detentora dos direitos de filmagem. Mas mesmo assim, e todo mundo comenta, nos filmes da Marvel (e da sua arquirrival DC), a estafa geral já é sentida há um bom tempo.
Não é mistério para ninguém que, desde que a era clássica dos Vingadores no cinema acabou, com o desfecho mortal do embate entre Thanos e Homem de Ferro, no já mítico Vingadores: Ultimato (2019), a Marvel Studios tentou, tentou, mas não conseguiu até hoje repetir o sucesso dos grandes momentos de então.
Filmes posteriores como Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (2021), ou até mesmo o último Guardiões da Galáxia vol. 3 (2023) foram estratégias certeiras, sucessos respeitáveis de bilheteria, mas que representaram também lampejos finais da criatividade de uma fórmula cujo desgaste seria inevitável - mas cuja eficiência poderia ter sido prolongada por mais algum tempo.
O grande problema é que a Marvel quis fazer no cinema algo que já foi feito inúmeras vezes nas HQs, que é aposentar ou descansar alguns heróis, tirar o foco de uns e jogar sobre outros, trocar alguns de lugar e de evidência. Ou seja, reciclar seu universo e mudar um pouco o cardápio. Mas se esqueceram de uma premissa básica: o mundo do cinema não é o mesmo dos quadrinhos. Os públicos são diferentes, e se comportam de maneira diferente. Uns compram a aposta e topam bem essa parada, são mais abertos a variações, outros não. E custear e produzir uma série de gibis (como diziam na minha época) ou de graphic novels, seja lá o que for, nunca será o mesmo que produzir um filme para cinema ou um seriado de streaming, que envolvem elementos, equipes, gastos e detalhes muitíssimo diferentes, e que podem comprometer seriamente todo o resultado final!
Infelizmente, há uma triste realidade por trás do fato de que a Marvel acabou por começar a levantar a sua própria lápide no mundo do cinema, abandonando heróis lendários e já familiarizados há anos pelo grande público - e que não é só o público básico de quadrinhos - como o Capitão América, Homem de Ferro, Thor e Hulk (esses últimos rebaixados à condição ridícula de personagens de comédia).
Jogar holofotes sobre um segundo escalão, composto por figuras como Os Eternos, Homem Formiga, Dr. Estranho, Capitã Marvel, e no streaming, Cavaleiro da Lua, Mulher Hulk, e a mais recente Echo, provou ser uma manobra arriscada e muito temerária da Marvel para manter o interesse das plateias. E agravada por alguns pontos cruciais:
2) Justamente em Pantera Negra 2 - Wakanda Forever, a gente se depara com uma das armas mais letais que a própria Marvel acaba usando contra os seus heróis: a mudança de enfoque nas tramas e na própria natureza das personagens, para agradar ou atender a tendências sociais atuais, movimentos e "minorias", e assim tentar alavancar mais público. Só que acaba acontecendo o contrário. Eu, assim como tantas outras pessoas fãs dos quadrinhos que eu conheço, não considero aquele soberano dos mares que está lá, no filme, interpretado por um tal de Tenoch Huerta, como o verdadeiro Namor, o Príncipe Submarino. Não mesmo, não adianta. É um outro ser. Para atender a uma parcela do público e da crítica que elogiaram o primeiro Pantera Negra, por sua celebração à diversidade das etnias e suas culturas, a Marvel simplesmente me transforma um dos seus mais icônicos personagens num mutante 'cucaracho', com ramificações anfíbias nas antigas civilizações maias e astecas que afundaram na água, substituindo a Atlântida por um outro reino e transformando tudo numa "fiesta do chicano doido" que descaracterizou totalmente o contexto original do Namor - cuja história era muito mais ligada, na verdade, à do Capitão América, na Segunda Guerra Mundial. Eu não me importo se não queriam que o espectadores confundissem a Atlântida do Namor com a do seu colega análogo da DC, o Aquaman! Nos quadrinhos, ambos sempre vieram desses reinados, e tudo bem, nada a ver um com o outro, e cada um na sua. E o Namor original tinha muito mais apelo, carisma e motivação do que aquele cara insosso que colocaram lá.
3) Certas liberdades poéticas da Marvel em suas adaptações para as telas são simplesmente um desastre. Um exemplo gritante: a She Hulk, ou Mulher Hulk. Uma série de streaming que, também na busca por pegar carona na tendência do "empoderamento" feminino, foi feita na pressa e no desleixo (inclusive dos efeitos especiais, sobre os quais falaremos agora mesmo), com um roteiro pífio que transformou a história da personagem em uma espécie de comédia bufona, com exageros de metalinguagem e quebras de conceito irritantes em relação ao que liamos nos quadrinhos. O filho do Hulk que aparece no último episódio, por exemplo (o Skaar), é uma das visões mais patéticas e deploráveis de personagem adaptado que eu vou guardar na memória, por muitos anos.
4) Vovó já dizia: a pressa é inimiga da perfeição. E a Marvel desrespeitou essa regra abundantemente. Num dos maiores exemplos de correria para faturar com filmes e séries - bem, talvez isso seja mais culpa da Disney, que se apropriou da coisa toda - a empresa foi acusada de pressionar e estressar seus técnicos de efeitos especiais com prazos descabidos e absurdos, para entregar suas séries e filmes. A já citada série da Mulher Hulk tem alguns dos piores CGI já vistos em muito tempo, com um episódio em que a perna da personagem "estica" de forma grotesca. O "terceiro olho" do Dr. Estranho, no filme Multiverso da Loucura (2022), que parece recortado de uma imagem no Paint e jogado na testa dele de qualquer jeito, causou risadas em muita gente. E a coisa chegou a um extremo tão impressionante, que o filme Homem-Aranha: Sem Volta para Casa (2021) saiu em uma versão inicial, para atender à data anunciada de lançamento do filme, e depois de dois meses foi relançado com uma outra cópia, contendo alguns dos efeitos especiais nas cenas corrigidos, após críticas dos fãs. Toda essa celeuma engrossou também, pouco tempo depois, a famigerada greve dos roteiristas de Hollywood, que foi a mais longa já ocorrida até hoje, e que teve a adesão de vários desses técnicos de estúdio revoltados com as exigências da Disney/Marvel, causando um impacto negativo jamais antes sentido na indústria cinematográfica norte-americana.
Inegavelmente, sabemos que tem muita coisa que foi feita no anseio de realmente continuar com obras que agradassem, e que continuassem atraindo os fãs. Bons resultados também ocorreram: os já citados Guardiões da Galáxia, e séries como WandaVision e o último Loki (apesar de umas forçadas de barra na mudança de natureza do personagem). Apesar dos desacertos, a Marvel está prometendo para, em breve, um grande retorno à sua fase áurea, com o ingresso dos X-Men em seu universo (através do novo filme do Deadpool), do Quarteto Fantástico, e da nova epopeia dos Vingadores, em nova formação. Vamos ver, né?
E sobre a DC, não vamos falar nada? Bem, o que falar de um universo cinematográfico integrado que já nasceu errado? Descontando as icônicas produções lá atrás que, essas sim, revolucionaram ou praticamente criaram o jeito de se fazer filmes de super herói moderno - o Superman clássico, da série com Christopher Reeve, ou as versões do Batman de Tim Burton, e depois Chris Nolan - o chamado DCU foi uma catástrofe desde que ocorreram alguns equívocos de rota por parte de um approach mais sombrio de Zack Snyder, em relação ao Super-Homem e à Liga da Justiça, ou quando na tentativa de reverterem a tendência e tornarem tudo mais leve e colorido, ao estilo das séries produzidas para o Canal Warner (CW), aprontaram patetadas com os últimos filmes do Shazam, Mulher Maravilha, e Flash. O que vimos foi, simplesmente, a queda em parafuso de um universo de heróis que nas HQs era fantástico, mas nos cinemas, se tornou irreconhecível.
Agora, estamos às voltas com James Gunn, o ex bam-bam-bam que fazia os Guardiões da Galáxia da Marvel, e depois se bandeou para o lado da DC, vindo a se tornar o seu novo chefe. Ele, agora, produz a nova versão de Superman, com David Corenswet como o paladino azul da capa vermelha, com previsão de lançamento para o ano que vem, e promete um retorno do herói ao seu conceito original, como símbolo da justiça, da esperança, e até mesmo do bom humor. É isso aí, Gunn.
Que volte, afinal, a ser super novamente.
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