sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

OS 40 ANOS DE 'O RETORNO DE JEDI' (e o caos na Força depois disso...)

 

Ainda me lembro de uma manhã ensolarada, no pátio do prédio de condomínio aonde morávamos, em São Vicente-SP, em que o papo de toda a garotada era sobre aquela disputa de quem tinha ido assistir primeiro os dois principais filmes infanto-juvenis daquele ano de 1983, os campeões de bilheteria entre a molecada na faixa etária em que estávamos, entre os 8 - 12 anos de idade: Superman 3 e O Retorno de Jedi.

E apesar de ter saído um pouco depois, mais para o final do ano (especificamente, no mês de outubro de 83), já dava para sentirmos no ar que o hype estava maior em torno daquele último exemplar de Star Wars, que fechava então a mitológica saga dos personagens de George Lucas no cinema. Enquanto o super-herói da DC Comics, desempenhado por Christopher Reeve, sofria críticas pelo tom mais "diferentão" e paródico de seu terceiro filme, 'Return of the Jedi' era aguardado com grande apreensão por todos os fãs, devido aos acontecimentos trágicos do filme que o antecedia, e que causara enorme balbúrdia e comoção, O Império Contra-Ataca (1981), onde Darth Vader revelava ser o pai de Luke Skywalker e o derrotava num duelo de sabres de luz, e o carismático Han Solo terminava subjugado pelo Império e congelado numa cápsula de carbonita. Até hoje, ficou representando o mais clássico modelo de filme sombrio onde tudo dá errado para os heróis, de forma a suscitar (e excitar) a audiência para uma continuação onde tudo possa se resolver - modelo seguido à risca e com perfeição anos depois pela Marvel, nos seus filmes dos Vingadores: 'Guerra Infinita' e 'Ultimato' (2018 e 2019, respectivamente).

Cartaz original do filme nos cinemas

Naqueles saudosos tempos, mais calmos e mais simples, sem tantos spoilers, sem redes sociais e informações que revelavam praticamente todo o teor das obras artísticas - sim, ir ao cinema ver um filme era ainda uma autêntica aventura, não se sabia o que poderia se encontrar - não havia muita noção de que esse filme pertencia a uma trilogia que se encaixava em algo bem maior projetado pela mente de seu criador George Lucas, e ainda chamávamos todos aqueles filmes de "Guerra nas Estrelas", ou "filme pertencente à série Guerra nas Estrelas", era tudo mais provinciano e abrasileirado mesmo. 

Mas a verdade é que, a despeito de Retorno de Jedi amarrar sim, e muito bem, as pontas deixadas soltas 'para o lado negro da Força', do filme anterior, muita gente não escapou de sair um pouquinho decepcionada dos cinemas quando finalmente o assistiu. Mesmo que Superman 3 tenha sido mais alvo de críticas por parte de público e imprensa, do que a última aventura de Leia, Luke e cia.

Ewoks: o lado "fofo" da Força

O problema era o tom um tanto quanto "fofo" e mais infantil de uma boa parte da trama passada na lua de Endor, onde o Império tinha uma base de controle escondida para o comando da sua nova e letal Estrela da Morte, e que era habitado por uma população nativa de "Ewoks": ursinhos de pelúcia selvagens e emissores de grunhidos que interagiam em pé de igualdade com os nossos rebeldes protagonistas da trama, passando a ajudá-los e tomando um enorme tempo de tela. Não que fosse de todo ruim - mas talvez se a solução do roteiro original fosse adotada, de colocar os wookies (irmãos de raça do Chewbacca) no lugar, poderia ter agradado mais certa parte do público.

Era, no entanto, a conclusão mítica de uma das maiores séries da sétima arte, e nos lembremos de que não havia tantos filmes feitos em sequências daquela forma, até então. A simbologia toda por trás do uso da Força estava lá, os ensinamentos de Mestre Yoda e de Obi Wan Kenobi, bem como vilões lendários como Jabba, o imperador Palpatine, o mercenário Boba Fett (em sua primeira aparição!) e, óbvio, o grande, o maior de todos, o temido e abominável Darth Vader. O tom épico de seu duelo final com Luke Skywalker, sob uma trilha sonora orquestral e grandiloquente, já entrou há muito para a galeria das grandes cenas do cinema. E o desfecho a seguir reafirmava tudo aquilo que as profecias jedi já anunciavam - de que o verdadeiro responsável por restabelecer o equilíbrio da Força, no universo, era Vader. Ou Anakin Skywalker, como preferir.

Vader versus Luke: o duelo final de sabres de luz, entre pai e filho

Império vencido, festa dos rebeldes, espíritos iluminados dos jedi que se tornaram um com a Força, mediante os olhares de Luke feliz mas, ao mesmo tempo, reflexivo no final da película. E acabava, bem ali, a era clássica de Star Wars. Aquela primeira, canônica, irretocável e mágica, de 3 filmes originalmente concebidos, e pronto, eis aí. Ponto final.

Mas calma. Não. Agora é que a bagunça ia começar.

A trilogia original, tal qual foi imaginada e lançada, era um ciclo conciso que se fechava em si, dando toda a noção da mitologia daquele universo de personagens, e dosando com perfeição aventura, drama, suspense, fantasia, e até elementos de humor. Assim que foi concluída, estabeleceu um parâmetro de exploração comercial típica dos blockbusters, com um sem-número de subprodutos e itens de consumo, mas sem novas tramas oficiais, e assim teria continuado... não fosse a própria sanha do seu criador, George Lucas, e logo mais adiante da Disney, para expandir à exaustão esse universo.

Han Solo (Harrison Ford), no 'Guerra nas Estrelas' original

Rebuscando rascunhos e ideias há muito engavetadas, Lucas e sua equipe deram o pontapé à trilogia que antecederia todos os acontecimentos do Guerra nas Estrelas original, de 1977, e que iniciava já como "Episódio 4" - ou seja, havia o esboço de uma trilogia anterior, que contava como surgiram o Império do mal, a Aliança Rebelde, e principalmente, o icônico Darth Vader. Obviamente, que o foco todo dessa nova etapa de filmes era a transmutação do jovem Anakin Skywalker, de padawan (aprendiz de guerreiro jedi) a mestre sith, migrando do lado bom para o lado negro da Força. Com resultados irregulares, ligados a elenco, alguns novos personagens insólitos (como o bizarro Jar Jar Binks) e furos na trama em relação à trilogia original, os novos filmes feitos a partir de 1999 foram bastante criticados pelos fãs na época, e apenas mais recentemente passaram por um revisão de conceitos que lhes reservou um bom lugar na mitologia da saga.  Entre mortos e feridos, salvaram-se quase todos, com o pobre Anakin enfim sendo "cibernetizado" na figura do tétrico e gutural Darth Vader na conclusão dessa nova trilogia. O trágico A Vingança dos Sith (2005), portanto, acabou sendo realmente um filme muito bom, conseguindo emular o clima épico dos filmes clássicos.  

O bizarro Jar Jar Binks

O plot twist mais tresloucado jamais imaginado por todos vai ocorrer em 2012, quando finalmente é sentido um forte abalo na Força: George Lucas abre mão da  produtora LucasArt e de todos os seus direitos sobre os filmes e personagens Star Wars. Para quem? Mickey Mouse.

A partir daí, a Disney se torna a produtora oficial da saga Star Wars, e resolve quebrar a banca anunciando, para 2015, a nova trilogia Star Wars no cinema, agora unindo passado e futuro, dando continuidade a toda a trama original e juntando novos e velhos personagens. É a "era Rey", com uma menina catadora de lixo desempenhada pela atriz britânica Daisy Ridley, que vai se revelar como detentora de ancestrais poderes jedi. Para dividir os holofotes com ela, um protótipo de Vader, na forma do sobrinho dele, Kylo Ren (interpretado por Adam Driver). E o show vai começar, com o sétimo, oitavo e nono episódios.

Finn (John Boyega), Rey (Daisy Rdiley) e Poe Dameron (Oscar Isaac): o trio de protagonistas casca grossa da última trilogia Star Wars nos cinemas

Resumo da ópera espacial toda: em meio a um fan service defenestrado idealizado pelos executivos de entretenimento da Disney, levando a uma espécie de "pasteurização" da saga, surge toda uma leva de novos personagens, que ora funcionam, ora não - difícil reconsiderar o arremedo de Han Solo que é o personagem Poe Dameron (Oscar Isaac), ou a falta de carisma do Finn (John Boyega). Também não consigo evitar um sentimento de ojeriza toda vez que vejo aquele tal de DJ, interpretado com uma overdose de trejeitos demenciais pelo Benicio Del Toro, no oitavo episódio (Os Últimos Jedi, de 2017). Parece que, de repente, todo mundo em Hollywood quis se aproveitar do evento pop que é Star Wars, mas adulterando conexões emocionais com sua extensa legião de fãs, se apropriando grotescamente de seu encanto primal e o subvertendo à linha de produção do mercado. Fagulhas da magia dos filmes originais aparecem aqui e ali, em certos momentos, mas a verve da velha proposta não está mais lá, os roteiros não se sustentam nessa vibe. É como a velha história de querer inventar demais para redescobrir a roda, que já foi inventada. 

Kylo Ren

E o pior de tudo, e que a uma altura dessas já deixou de ser spoiler há muito e muito tempo, em uma galáxia distante: para deixar raivosa toda uma imensa gleba de fãs puristas, vemos o completo extermínio do trio original de protagonistas da série. Em cada um dos filmes, vão padecendo Han Solo, Luke Skywalker e Leia, um a um. E não é val dizer que porque Carrie Fisher já tinha falecido na época do lançamento do último filme, então seria preciso matar sua personagem - vamos lá Disney, vocês mesmos são pioneiros na utilização de tecnologia digital e IA para recriar figuras, vide os produtos derivados de Star Wars em suas séries de streaming e o filme avulso Rogue One (2016). 

Confesso que eu, assim como tantos outros, também fiquei bastante decepcionado com as mortes desses personagens clássicos - todo mundo estava lá para vê-los interagindo mais, entrando em ação, e realizando aquela velha química que havia entre eles. Juntos! Mas não tivemos nada disso. Luke, um dos maiores símbolos de esperança na galáxia, se tornando um ermitão ranzinza e antipático, jogando fora o seu próprio sabre de luz, recuperado pela Rey! Há quem ainda considere a luta "holográfica" dele, transmitida direto de seu retiro em 'Os Últimos Jedi', uma piada de grande mau gosto com o cânone da saga... 

Luke Skywalker (Mark Hammil): bancando o ermitão ranzinza e antipático

Passado tudo isso, e os absurdos já cometidos pela Disney em sua louca cavalgada rumo à exploração extrema do universo jedi em mais séries de streaming com tramas empoladas, e mais subprodutos, agora já se fala em uma "nova saga", com mais filmes da personagem Rey, pobre jedi que não tem sossego. E que ainda evoca e toma para si o sobrenome 'Skywalker', para que este não tenha também. Que a Força proteja a todos nós!


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